Dando uma olhada na Revista Vida Simples deste mês, li este texto do Ronaldo Bressane.
Adorei! Então resolvi compartilhar aqui com vocês.
Boa leitura!
Socializou geral: a criação individual (e, eventualmente, o egoísmo) passou a ser questionada por uma série de artistas, produtores de conteúdo e até comerciantes. São os tempos, como dizem alguns, da “cultura wiki” (de Wikipédia, a enciclopédia online construída por milhões de autores anônimos). Mas será mesmo possível que o conhecimento seja criado coletivamente? Melhor dizendo: quais são as fronteiras entre individualidade e coletivo na solução de um problema? Dentro da nova consciência de socialização do pensamento trazida pelo colaboracionismo na web, é possível sobreviver sendo um individualista extremo? No telecatch entre competição e colaboração, quando é que acontece a passagem de bastão entre a mentalidade das Décadas do Eu (70, 80, 90) para a nova mentalidade colaborativa dos anos 00? E afinal: existe mesmo uma criatividade coletiva? Se sim, ela pressupõe o fim da autoria?
Muitas perguntas. Mas façamos uma diferença clara, binária, entre a inteligência individualista, da obra fechada, do ponto fixo, e a colaborativa, da obra aberta, da rede. Sobre esta segunda é fundamental a Obra Aberta de Umberto Eco, revolucionário estudo da teoria da informação lançado, não por acaso, no ano de 1968. Ali o ensaísta italiano propõe uma divisão entre o discurso aberto (pense na internet, de múltiplos emissores e receptores) e no discurso persuasivo (pense na TV, um só emissor, vários receptores).
Quando sugeria a “obra aberta”, Eco apenas intuía a formulação de um modelo de produção somente viável graças à nossa aceleração tecnológica. O impacto da internet tornou possível tanto ideias como o open source (do software aberto, como o Linux) quanto a disseminação de redes sociais que sustentam a ideia de uma imaginação colaborativa: nas artes plásticas, na música, na mídia, no comércio. (Ainda falta a política, mas chegaremos lá.)
Essa verdadeira inteligência colaborativa foi definida nos termos de hoje pela cientista norte-americana Vera John-Steiner, em Creative Collaboration (“Colaboração criativa”, sem edição brasileira). A autora investiga como as ideias surgem através da observação do método de trabalho de parcerias famosas, como entre os artistas Georges Braque & Pablo Picasso, ou os físicos Albert Einstein & Niels Bohr. Por certo o estudo de Vera seria ainda mais interessante se ela se detivesse no curioso caso dos escritores argentinos Jorge Luis Borges & Adolfo Bioy-Casares, que narravam “sob uma terceira persona”, um tal Bustos Domecq. Ou, em exemplo mais próximo, na intrigante maneira como os jovens escritores brasileiros Vanessa Barbara & Emilio Fraia construíram uma identidade literária comum inventando a quatro mãos o elogiado romance Verão de Chibo.
A web abriga diversas iniciativas graças a uma nova “inteligência coletiva”.
Pesquisando inteligência colaborativa na web (onde mais eu arranjaria tanto assunto?), topei com o blog de Gilberto Jr., um esperto designer de interfaces que se dedica a estudar tanto a ciência das redes quanto orientar um grupo de leitura coletiva da… Bíblia. Atendo-se aos aspectos terrenos da web 2.0, Gilberto indica a leitura de um excelente artigo de Kathy Sierra sobre a sabedoria das multidões. Segundo essa crítica professora de programação e criadora de games norteamericana, aproveitar a inteligência coletiva pode trazer muitos benefícios – desde que não seja necessário um consenso prévio entre a comunidade em questão. Assim, agregase de algum modo a sabedoria de cada indivíduo independente (e a interdependência é a senha aqui). Kathy exemplifica:
• inteligência coletiva é um monte de gente escrevendo resenhas de livros na Amazon. Burrice das multidões é um monte de gente tentando escrever um romance juntos;
• inteligência coletiva são todas as fotos no Flickr, tiradas por indivíduos independentes, e as novas ideias criadas por esse grupo de fotos. Burrice das multidões é esperar que um grupo de pessoas crie e edite uma foto juntas;
• inteligência coletiva é pegar ideias de diferentes perspectivas e pessoas. Burrice das multidões é tirar cegamente uma média das ideias de diferentes pessoas e esperar um grande avanço.
Segundo Kathy, um link não fica em primeiro lugar no Google depois que todos os usuários da internet chegam a um consenso de que aquele link é o melhor. Mas o Google aproveita a inteligência coletiva contando mais pontos para os links que são citados por muitos indivíduos independentes. Por buscar consenso entre os editores dos artigos, a enciclopédia colaborativa Wikipédia poderia ser um fracasso, mas o trabalho dos administradores (tomando decisões nem sempre geradas pelo consenso) determina a qualidade do conteúdo. Isso significa que, mesmo socializada, a inteligência colaborativa não dispensa um eixo organizativo; em outras palavras, é preciso um editor.
leia texto completo aqui.